Não é possível se esconder mais

Mariana Camara
3 min readJun 29, 2021

Eu entrego a timidez nos braços da ursa e me despeço da Mariana de antes

Eu sempre fui uma pessoa extremamente tímida, daquelas que travam para falar, que tinha vergonha de comer em público, que não levantava a cabeça afim de olhar outras pessoas. Eu achava muito complicado e difícil interagir com as pessoas, o que falar, como puxar assunto, como ser uma pessoa sociável, que fala coisas relevantes e com segurança.

A timidez me dava muita “segurança”, onde eu evitava ser alvo de alguém. E, de certa forma, eu acabava respeitando os espaços alheios. Então as pessoas tinham confiança comigo, o restrito grupo de amigos que eu tinha.

Entretanto, a timidez que eu vivia era muito sufocante e limitadora. Eu perdi muitas oportunidades no começo da minha juventude, desde conversar com pessoas importantes até criar laços afetivos.

Eu passei grande parte da minha vida, isso porque só tenho 23 anos, usando da introspecção como limitação, manter-se numa zona de conforto horrível, refúgio e esconderijo. Porque, afinal, eu era uma mulher negra e logo aos 14 anos eu me descobri lésbica. O mundo é muito cruel com gente como eu. Eu me lembro de uma frase que ouvi quando assumi minha sexualidade para uma das pessoas mais importantes para mim, e ouvi um: “mulher, negra e pobre… será lésbica por quê?”. Com 13 anos eu era uma pessoa ansiosa e começando a ter um estado deprimido.

Quando eu tive contato com o Xamanismo, eu comecei a ver sobre a roda das estações. No Outono, a direção Oeste, é o momento de entrarmos na caverna da Ursa e fazer algumas mortes, como deixar padrões de comportamentos e encerrar ciclos. Para isso, demanda uma introspecção. O Urso se alimenta de muitas coisas durante o ano, principalmente quando está próximo de embernar. Quando ele entra em sua caverna, ele processa tudo aqui que consumiu. No baralho cigano, o Urso tem o significado de cuidado com excessos. Um dos meus animais que me acompanham é uma grande Ursa, que carrega a energia do amor e ensina que podemos e faz parte nos recolhermos para podermos refletir, mas não carregar excessos, seja de medo, dor, ansiedade e afins. A introspecção tem que ser usada como ferramenta de autoconhecimento, de fortalecimento do que somos e de restruturação das nossas relações.

Hoje eu tenho muita segurança do que antes. Eu sou tímida, porque é uma característica minha e, em alguns casos, eu preciso ficar sozinha ou com pouca interação, principalmente porque eu entendo que é esse o meu jeito, com certa mais saudável, de viver minhas relações. Caso eu queira desrespeitar essa parte minha, pelo menos agora, poderei ter um desgaste emocional que não conseguirei recuperar facilmente. Eu tenho medos, sou ansiosa, tenho inseguranças e as vezes minha autoestima quanto minhas interações sociais está baixa. Isso faz parte e é nesses momentos que ser uma pessoa introspectiva é muito importante, porque entendo os meus momentos.

Eu não tenho muitos amigos, não saio todo fim de semana (até porque estamos numa pandemia), meu WhatsApp não é lotado diariamente de mensagens e está tudo bem. Eu saio para lugares que são mais caseiros e que me recarregam ao invés de me desgastarem, as vezes meus amigos vêm conversar comigo ou interagem nas minhas redes sociais e reafirmamos nossa amizade com gestos simples, eles são pessoas maravilhosas que entendem os meus momentos e que podemos trocar sempre que sentimos.

Antes eu queria muito ser uma pessoa extrovertida, porque era o que as pessoas mais desejam ou parecem desejar. Eu sempre via pessoas que eram bem abertas rodeadas de pessoas e ficava imaginando se isso seria possível para mim. Mas depois eu entendi que ser introvertida e extrovertida não são sinônimos de ser ruim ou bom, e que tudo bem eu ser introvertida, desde que isso não impacte de forma negativa minha vida.

Entendo que não devo esconder quem eu sou, porque de toda forma eu sou desse jeito e tem gente que me ama do jeito que eu sou. As vezes o sol precisa se esconder nas nuvens que passam na sua frente, mas não as usam como esconderijo e de sua luz.

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Mariana Camara

Macumba, musculação, literatura, lesbianidade e surtos de escrita que me fazem ir e voltar deste lugar. Insta: @mariric_