O Barba Azul vestido de mulher

Mariana Camara
2 min readSep 29, 2021

Eu não tive bons relacionamentos durante a minha vida e, olha que, eu não tive muitos relacionamentos. A melhor parte que todos têm em comum, seria o fato de terem acabado. As vezes cogito em esquecer, mas mensalmente eu revisito essas histórias.

Já passei da fase de me culpar, mas sempre fico investigando o que aconteceu. Seria uma tortura mental que faço comigo mesma? Na verdade, não. Revisar tudo o que aconteceu me faz entender um pouco sobre mim. Todas as vezes que revisito esse passado, eu penso como posso ser diferente no futuro. Eu sinto a sensação de querer morrer, porque ainda preciso deixar morrer algumas partes minhas.

O fato é que todas as quatro mulheres que passaram na minha vida, deixaram um legado de dor e apresentaram uma parte nova minha. As vezes acho que elas apresentavam a mesma parte que eu vivia fugindo ou desconhecia. Eu fugia mesmo, eu tinha mania de fugir de fugir das coisas. Elas foram pessoas ruins na minha vida, mas não consigo chamá-las de ruins. Não gosto de falar das coisas que me fizeram passar, pois eu não quero que pensem que foram loucas ou que são ruins. Pessoas boas também fazem coisas ruins, não é mesmo? Mas talvez eu não esteja empregando as suas responsabilidades quando nego essa parte delas. Então eu evito falar delas.

Me lembro de quando minha psicóloga leu o conto do Barba Azul. Eu tinha lido um dia antes dela ler, mas não falei nada para não estragar essa parte e, é diferente quando lemos para nós e quando leem para nós. Depois que ela leu, as outras integrantes daquela terapia em grupo, conseguiram falar suas percepções e eu não tinha entendido como aquilo me atravessava. Dias depois, eu entendi.

Eu percebi que na minha vida eu tive quatro Barbas Azuis e que, eu sempre fico a proteger a imagem deles (delas). Entender isso foi difícil, até porque esses quatro Barba Azuis não passavam de quatro mulheres que eu protegia de uma realidade que realmente existiu e de suas responsabilidades. Eles sempre estavam ali, mas eu estava preocupada em me olhar no espelho e ver se eu não estava me tornando um.

Por que a gente protege quem nos quebrou ao meio e não a nós mesmos? A gente encara como se a outra não pudesse nos ferir, porque ela não tem uma barba, e achamos que nós somos o motivo e autoras de nossas violências.

Revisitar esse lado e encaixar os rostos como são, às pessoas que já se foram com um pouco de seu sangue e suas lágrimas nas mãos, é uma forma interessante de mudar a visão sobre o passado, mas, principalmente, sobre si mesma.

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Mariana Camara

Macumba, musculação, literatura, lesbianidade e surtos de escrita que me fazem ir e voltar deste lugar. Insta: @mariric_